Cruzeiro tenta sair da crise em meio a dívidas milionárias e repasses do governo bloqueados

Enquanto enfrenta guerra política e sindical, Rafic busca apoio para reaver verbas e projeta pré-candidatura à reeleição

Prefeito Rafic; verbas paralisadas devido a problemas com certidões e dívidas milionárias. (Foto: Francisco Assis)
Prefeito Rafic; verbas paralisadas devido a problemas com certidões e dívidas milionárias. (Foto: Francisco Assis)

Francisco Assis

Cruzeiro

A crise econômica que gera estragos nos cofres de municípios em todo país passou como um tornado por Cruzeiro. Mas a fragilidade administrativa e política da cidade facilitou a degradação financeira, com resultados no funcionalismo, comércio, indústria e serviços.

A crise foi destacada pelo prefeito Rafic Simão (PMDB) durante as discussões com o sindicato dos Servidores, que deflagraram greve no último mês. Sem acordo, Rafic e sindicalistas brigam agora na justiça.

Nesta semana, o prefeito falou à reportagem do Jornal Atos, em entrevista que enfatizou déficit econômico e a ciranda da Prefeitura em busca de verbas, paralisadas devido a problemas com certidões e dívidas milionárias.

 

Jornal Atos – Após semanas de discussões e manifestos, a greve foi parar na justiça. Porque Prefeitura e Sindicato não conseguiram dialogar?

Rafic Simão – Nossa proposta de 7,3% era a maior dada até hoje e isso no pior período. Temos recessão, redução de repasses, dificuldades e fizemos proposta acima do que poderíamos. Nas duas faixas salariais acima da Prefeitura, e, R$ 2 mil, estendemos o vale alimentação em R$ 15 reais. Privilegiamos quem ganha menos, mas o sindicato tinha uma eleição na semana seguinte, não sei se isso interferiu ou se foi dificuldade de passar o que é tratado aqui para a assembleia. O fato é que dos 2,4 mil funcionários, nestas assembleias sempre vão por volta de cem e geralmente estes cem são mais envolvidos com políticas, os que mais reclamam e infelizmente são os que menos trabalham. Tumultuam e o presidente sede a pressão.

Atos – Essas dificuldades então foram políticas?

Rafic – Eles queriam 11,5% que está fora da realidade, não só de Cruzeiro, mas de todo país. Jamais poderíamos, em nosso estado, dar um aumento deste. Achamos que isto está ligado à eleição, porque se promete isso e aquilo para agradar os sindicalistas.

Atos – A Prefeitura também levou o caso à justiça?

Rafic – Eles não tiveram adesão necessária, a Prefeitura não parou. Aquela turma que Esteve em frente à Prefeitura, com o passar dos dias foi minguando e retornando ao trabalho. Mesmo assim, para valorizar os funcionários que trabalharam e para poder cobrar os dias parados, ingressamos na justiça, pois não sabíamos até que ponto ia esta greve. Uma decisão judicial a tornou ilegal e mandou os funcionários voltarem ao trabalho em 24 horas, com pena de multa diária ao sindicato. Isso mostra o exagero que foi esta greve, como foi feito, a negociação. Eles entraram também na justiça. A justiça é que vai decidir essa questão. Nós vamos descontar os dias parados.

Atos – Além dos salários, o sindicato debateu abonos e benefícios. Protestaram contra uma redução. O que há de fato nisso?

Rafic – É a questão de uma gratificação. Entre 1997 e 2008, tínhamos gratificações, que o Tribunal de Contas apontou como ilegais e agora decidiu que é inconstitucional. A lei determinou e temos que cumprir. Maldosamente colocaram como se eu tivesse tirado. Dos 2400 funcionários, cerca de trezentos ganhavam essa gratificação. Somente estes foram afetados. A Prefeitura foi obrigada por decisão judicial. Se não retirar, eu Rafic tenho que pagar por mês R$ 82 mil por mês. Não posso fazer isso, por causa de erros de ex-prefeitos. Agora, o funcionário está no direito de brigar na justiça por essa gratificação. Se conseguir, eu retomo. Não posso ir é contra a justiça. Se a lei é para pagar, pago, se é para tirar, tiro.

Atos – Falando em política, a Prefeitura é alvo de vários apontamentos de vereadores. Entre eles, denúncias e relatórios do TC. Em meio à crise, a Prefeitura consegue dialogar com o Legislativo?

Rafic – Sempre procuramos negociar, nos aproximamos dos vereadores, queremos eles governando junto. Pedimos o apoio deles e os tratamos da mesma forma e estamos com as portas da Prefeitura abertas. É claro que alguns vêm mais até a gente, para pedir ajuda aos bairros, solicitar um calçamento, cuidar destas questões de necessidades. Outros preferem não se aproximar tanto, adotam uma linha mais investigativa, mais oposicionista, mas não fazemos distinção ao trabalho dos vereadores.

Atos – Esse debate político prejudica a cidade que tenta sair da crise?

Rafic – Se a câmara apoiar o prefeito e a população também, entendendo o momento critico, vamos sair da crise o mais rápido que é. Infelizmente na política, é normal que as pessoas tenham projetos pessoais, mas isso acaba atrasando e dificultando um pouco. Se tivéssemos em nossa política uma linha de “vamos olhar a cidade em primeiro lugar”, teríamos maior velocidade para sair da crise. Eles gostam da cidade, mas o interesse particular não pode ficar a frente do interesse de toda a cidade.

Atos – Durante a discussão da greve, o senhor bateu na tecla da crise econômica. Além das dividas, não conta com repasses. Como solucionar isso e gerar renda?

Rafic – O município teve uma carga reforçada com a Lei de Responsabilidade Fiscal e a busca de se criar mais leis assim, aumentam a responsabilidade dos gestores públicos. Os prefeitos que pecavam faziam a cidade sofrer. Hoje, a lei aperta, vai espremendo o Executivo. Costumo dizer que os bons pagam pelos maus. Só que está chegando a um ponto de engessamento, que está tornando complicado prefeitar (sic). Estamos com restrições que a iniciativa privada não tem. Um exemplo é que você tem dentro do setor público a estabilidade do emprego. Não consegue eliminar os maus funcionários, não podemos mandar embora. Isso é engessamento. Uma empresa em crise pode reduzir o quadro, a Prefeitura já não pode. Se cai a arrecadação, ela tem que manter a folha e com menos recursos.

Atos – Esse problema com os repasses é devido às irregularidades com o Cadin (Cadastro Informativo Municipal)?

Rafic – Com a lei, quem não estiver em dia, com itens como Fundo de Garantia, INSS, não poderá receber repasses, porque o município que não estiver positivo na certidão, não recebe repasses, convênios, verbas parlamentares. Isso acontece aqui desde 2011. Estamos há quatro anos sem receber uma única verba de calçamento, nem estadual, nem federal. Isso prejudica muito nosso governo. Não bastasse isso, diariamente temos sequestros de verbas, por ações trabalhistas ou ações de desapropriações mal feitas, bloqueios de repasses como o FPM (Fundo de Participação Municipal), por causa do INSS. Esses dias, recebemos uma ação, por causa do INSS, de R$ 51 milhões. Como vamos pagar isso e outras dividas parceladas? Do FPM, integral poderíamos estar recebendo mais de R$ 3 milhões, mas não sobram nem R$ 130 mil ao mês.

Atos – Há quanto tempo a Prefeitura de Cruzeiro vem sendo deficitária economicamente?

Rafic – Há uma divida de mais de trinta anos, do Fundo Garantia, que ultrapassa os R$ 50 milhões. O município sofre com isso. Para agravar isso, esses repasses vão cair mais, e não podemos reduzir despesa. Isso afeta o dia a dia, a cidade não cresce, nós não conseguimos pagar o que queríamos e até no lado político temos problemas. Se eu fosse pensar primeiro em reeleição, falar em aumento, ceder aos pedidos seria bom pra mim, mas não posso. Não temos dinheiro.

Atos – O que vem sendo feito para liberar as verbas?

Rafic – Estou impetrando ação contra o governo federal, porque há dez anos, a Federação Paulista dos Municípios ingressou com uma ação de recuperação de crédito, de repasses que não foram feitos, do antigo Fundef (Fundo de Manutenção e Desenvolvimento do Ensino Fundamental) e mais o FPM. Em encontro do Codivap (Consórcio de Desenvolvimento Integrado do Vale do Paraíba) em são Luiz do Paraitinga, foi apresentado que Cruzeiro teria direito a R$ 58 milhões em repasses que teriam sido feitos e que se entrássemos na justiça poderíamos recuperar. Com isso, poderíamos pagar dívidas como a do Fundo de Garantia. Fora isso, estamos agindo, atualizando a planta genérica dos impostos municipais, cobrança da divida ativa, tudo para amenizar um pouco essa falta de verba. A curto prazo não temos muito o que fazer, mas a médio e longo prazo sim. Hoje, temos que enxugar despesas e buscar recursos paralisados.

Atos – O acordo da Maxion ajudou a amenizar o problema no planejamento?

Rafic – O momento econômico era de dar um passo para trás e nem que fosse para abrir mão de valores, mas o importante era garantir empregos. O sindicato enfrentou a oposição para buscar esse acordo, a demora gerou demissão de mais de 400 funcionários e isso causou um rombo na cidade. Mas agora pararam as demissões e a empresa disse que a estabilidade está garantida até o final do ano. A crise não vai ser a primeira, nem a última. Neste momento de baixa, quando não há faturamento para garantir empregos, o importante é buscar a negociação. Isso é essencial para a cidade sair da crise.

Atos – A indústria é o foco do projeto de Cruzeiro para sair do vermelho?

Rafic – Estamos buscando essa saída com o foco nas industrias, tentando atrair novos empresários. Fizemos a doação (de área para ampliação) à Carron, que hoje está buscando R4 50 milhões no mercado financeiro para a ampliação e isso vai gerar muito mais empregos na cidade, além da transferência da unidade de Taquaritinga para Cruzeiro. Só neste projeto serão trezentos empregos. Agilizamos as obras para a construção da Quality Steel, onde serão pelo menos 150 empregos, doações para pequenas e médias empresas (metalúrgica, caldeiraria e empresas de massas), que vão se instalar em breve. O que podemos fazer para estimular novas empresas, estamos fazendo, sem esquecer do comercial, tudo para passarmos essa fase.

Atos – Com esses problemas, qual expectativa para fechar as contas em 2015?

Rafic – Teremos dificuldade devido a produção econômica, queda repasses. O Governo Federal já assinalou com queda de quase 20% nos investimentos e maior parte deles é na saúde. O Estado deve ter redução de até 25%. Por isso defendo a redistribuição, pois tudo é jogado para os prefeitos. Saúde, iluminação, manutenção da cidade. As prefeituras recebem menor cota do montante. 60% é federal, 25% estadual e só 15% municipal. Não é justo ficar com a menor parte do bolo, porque a pessoa mora no município por isso tem que ter essa reforma, para garantir maior repasse aos municípios. Eu aqui em Cruzeiro, não consigo reduzir as despesas da noite para o dia. O repasse diminui e a folha cresce. Cresce em média 1.8. Cruzeiro herdou uma situação complicada e temos que trabalhar com isso.

Atos – E com tudo isso, o prefeito projeto uma reeleição?

Rafic – É certo que preciso dar continuidade. Se tudo correr bem e tivermos o apoio da população, podemos até por responsabilidade, pois existem projetos que dificilmente vamos conseguir terminar no ano que vém, então acredito que precisaríamos de mais tempo. Se tudo permanecer assim, somos sim pré candidato.

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